Conhecendo o Direito Ambiental (Parte 6 - Dano Ambiental)
Por Vanessa Soares
Retomando as publicações aqui do blog sobre "Conhecendo o Direito Ambiental Brasileiro", considerando o conteúdo do penúltimo post (nº 4) desta série, sobre responsabilidade ambiental (tríplice: administrativa, penal e civil), acredito que seja oportuno falarmos a respeito de dano ambiental, pois tem íntima relação com as questões relativas à reparação/responsabilização (um dos elementos para verificação da responsabilidade ambiental).
Considerando que a legislação ambiental brasileira não traz uma definição certa sobre o que é o dano ambiental, exponho abaixo as principais considerações a respeito, indicando análise normativa, doutrinária e indicação jurisprudencial para complementar os estudos a respeito do tema, para facilitar e contribuir de alguma forma para o entendimento do assunto.
Nessa linha, apesar de o ordenamento jurídico brasileiro não trazer uma definição específica acerca do que é o "dano ambiental", indica pistas significativas que contribuem para essa definição na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei Federal nº 6.938/1981). Vejamos:
Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
(...)
II - degradação da qualidade ambiental, a alteração adversa das características do meio ambiente;
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;
c) afetem desfavoravelmente a biota;
d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;
e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;
(...)
A mesma lei define 'meio ambiente' como "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas" (art. 3º, I).
José Rubens Morato Leite e Patrick de Araújo Ayala, nessa linha, pontuam que
"O legislador brasileiro, apesar de não definir expressamente dano ambiental, elucidou as suas características básicas, pois, conforme já foi exposto, definiu o conceito de meio ambiente (art. 3º, I, da Lei 6.938/81) e disse que o poluidor (aquele que provoca poluição) é obrigado a reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros (art. 14, §1º, da Lei 6.938/81) ou seja, em sua dupla valência na proteção do bem jurídico de sua versão de macrobem e em vista dos interesses pessoal e particular do microbem ambiental (...). Não obstante a falta de precisão textual de dano ambiental, o legislador trouxe o entendimento de degradação ambiental (...) evidentemente vaga, exigindo certo esforço de interpretação, a fim de determiná-la. Denota que a degradação ambiental é a alteração adversa ao equilíbrio ecológico" (p. 111, em Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. Teoria e prática, 7. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais).
A partir disso, e de uma forma muito geral e ampla, 'dano ambiental' pode ser considerado como toda situação antrópica e lesiva ao meio ambiente, que lhe diminua/altere a qualidade ambiental, de forma intolerável e prejudicial, provocando interferências desfavoráveis ao equilíbrio ambiental e à sadia qualidade de vida (veja exemplos jurisprudenciais (STJ), em relação a atividades de queima de cana de açúcar, a título ilustrativo: REsp 1.668.060/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30/06/2017 e AgInt no AREsp 1.071.566/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 9/5/2019).
Assim, apenas a título de conhecimento, academicamente falando há muita discussão a respeito disso, considerando as expressões normativas genéricas, Édis Milaré pontua que dano ambiental é
"(1) Dano sofrido pelo conjunto do meio natural ou por um de seus componentes, levado em conta como patrimônio coletivo, independentemente de suas repercussões sobre pessoas e bens (Direito Alemão). (2) É a lesão (alteração, prejuízo de um fator ambiental ou ecológico (ar, água, solo, floresta, clima etc.), que gere uma modificação - para pior - da condição do equilíbrio ecológico do ecossistema local ou abrangente (Direito Italiano)" (Dicionário de Direito Ambiental, 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunal, 2015, p. 257).
Milaré esclarece ainda que dano ambiental é
"(...) toda interferência antrópica infligida ao patrimônio ambiental (natural, cultural, artificial), capaz de desencadear, imediata ou potencialmente, perturbações desfavoráveis (in pejus) ao equilíbrio ecológico, à sadia qualidade de vida, ou a quaisquer outros valores coletivos ou de pessoas" (Direito do ambiente. 10. ed. rev., atual e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 319).
Morato Leite e Ayala registram que
"O dano ambiental, por sua vez, constitui uma expressão ambivalente, que designa, certas vezes, alterações nocivas ao meio ambiente e outras, ainda, os efeitos que tal alteração provoca na saúde das pessoas e em seus interesses. Dano ambiental significa, em uma primeira acepção, uma alteração indesejável ao conjunto de elementos chamados meio ambiente, por exemplo, a poluição atmosférica; seria assim, a lesão ao direito fundamental que todos têm de gozar e aproveitar do meio a ambiente apropriado. Contudo, em sua segunda conceituação, dano ambiental engloba os efeitos que esta modificação gera na saúde das pessoas e em seus interesses" (Ob. cit. anteriormente, p. 104).
Morato Leite e Ayala ainda acentuam:
"Da análise empreendida da lei brasileira, pode-se concluir que o dano ambiental deve ser compreendido como toda lesão intolerável causada por qualquer ação humana (culposa ou não) ao meio ambiente, diretamente, como macrobem de interesse da coletividade, em uma concepção totalizante, e indiretamente, a terceiros, tendo em vista interesses próprios e individualizáveis e que refletem no macrobem". (Ob. cit. anteriormente, p. 113-114)
Daí abordarem vários aspectos decorrentes do dano ambiental, como dano ecológico puro, dano ambiental em sentido amplo (lato sensu), dano individual ambiental ou reflexo, dano coletivo, e outros aspectos relativos à reparabilidade e extensão desses danos, como a reparação direta, indireta, patrimonial e extrapatrimonial (p. 105 e 106, por exemplo), dentre outras questões relevantes que envolvem o tema.
Encaminhando-nos para as considerações finais, é interessante pontuar, adicionalmente, de forma muito geral e ampla (considerando a complexidade do tema diante das hipóteses a serem avaliadas caso a caso), que as atividades consideradas lesivas ao meio ambiente estão definidas no âmbito federal sobretudo por meio do Decreto Federal nº 6.514/2008 e na Lei de Crimes Ambientais (Lei Federal nº 9.605/1988). É importante dizer que outras normas também poderão prever penalidades (exemplo, normas específicas sobre recursos hídricos, biodiversidade etc), mas acredito que essas duas já são um bom começo para uma análise inicial de um caso.
Por fim, é importante considerar também as normas estaduais e municipais que tratem do assunto nos seus respectivos limites territoriais.
* * *